Poluição

Estamos destruindo a vida com virulência tal, que parece suicídio. Seria uma morte procurada, se não fosse o resultado da destrutividade humana, aparentemente inevitável, que acabará mesmo com tudo que vale a pena. Só não o fará, de fato, se se desencadear uma nova revolução; depois da primeira, divina, que engendrou a vida; e da segunda, humana, que humanizou e mecanizou o mundo. A terceira seria um freio que detivesse a poluição e a destrutividade.

A morte de todos os homens seria, talvez, uma solução. A natureza, livre de nós, provavelmente, se refaria, revitalizando a vida, purificando os mares, limpando os céus. Isso, se a hecatombe não fosse uma bomba-do-fim-do-mundo, que apagasse, conosco, toda a vida. O planeta, nesse caso, voltaria simplesmente à sua natureza cósmica, libertado das impurezas da vida e das indagações da inteligência.

Até que surja por aqui algum extraterrestre falante, temos de admitir que “Deus, insensato, jogou em nós todas as suas cartas. Nessas circunstâncias, só nos resta assumir a responsabilidade de saber que nós, os humanos, somos o único olho com que o Universo se vê a si mesmo. Olho precário, que temos de corrigir e ampliar com filtros, telescópios e microscópios, para ver melhor as formas, as cores, as luzes deste mundo tão vasto e variado.

Somos, de fato, o esforço da matéria de que fomos feitos para se conhecer a si mesma. Se apagarmos, amanhã, que será do Universo? Um Universo cego, surdo e mudo, como uma pedra, é burro demais. Além de inútil. Nós somos, acredite, a flor da criação, o melhor que existe. Morrermos seria uma pena. Inconsolável e inconsolada. Sobretudo para nós.

Na verdade das coisas, não seria nenhum acontecimento sideral, se a vida se apagasse, espontaneamente, na Terra; assim como, espontaneamente, se acendeu um dia. Teríamos sido uma efervescência passageira, que mal deixaria marcas observáveis no planeta, dado o caráter espontâneo da combustão vital, que se auto-consome eficazmente.

 Seria, porém, uma tristeza do ponto de vista do agente ativo da morte da vida, que somos nós, os humanos. Para nós, portanto, nada é mais imperativo e urgente do que inverter esse processo, desencadeando uma terceira revolução, a ecológica, para que a vida sobreviva.

Só peço a Deus que intervenha, outra vez, e nos salve. Ou, pelo menos, nos ajude a nos salvar. A nós e a Ele. Que seria de Deus, se perecêssemos?

Este texto foi tirado do livro Noções de Coisas, publicado pela primeira vez em 1994, pela Editora FTD, com ilustrações de Ziraldo, e publicado pela segunda vez em 2013, pela Editora Global, com ilustração de Maurício Negro. Em ambas as versões, o texto está na pg 50.